ARRAIAL DO CABO

ARRAIAL DO CABO tem praias quase virgens e mar caribenho. É sonho dos mergulhadores e de quem procura pousadinhas à beira-mar e restaurantes de pescados fresquíssimos. Tudo isso mais barato que nos arredores. E ainda tem gente que só quer saber de Búzios e Cabo Frio...

O sol mal se levantou e já é intenso o movimento no cais da Praia dos Anjos, o portinho de Arraial do Cabo. Mesmo no verão, Arraial conserva a atmosfera de pacata vila de pescadores. De volta do trabalho em alto-mar, eles despejam nas caixas coloridas de plástico o que lhes deram as redes e os anzóis. E eles parecem ter sido generosos nessa madrugada. Gaivotas povoam os céus à espreita das sobras. Em sentido contrário, começam a chegar ao píer de concreto animados grupos de turistas acompanhados de seus respectivos guias. Desajeitados, embarcam em traineiras, escunas e saveiros, alguns com isopor e micro-system a tiracolo - o que não deixa de ser preocupante a quem busca sossego quando vai à praia.

Como se nada acontecesse ao seu redor, um senhor trama sua rede calmamente. Meninos mergulham dando saltos mortais. Homens cuidam do casco de uma canoa velha. Uma adolescente distribui folhetos promocionais de um restaurante. E centenas de barquinhos nas mais diversas cores e tamanhos descansam nas areias ou balançam ao ritmo das marolas.

As mesmas marolas embalaram a nau de Américo Vespúcio, o primeiro visitante do pedaço, que aportou em 1503 fundando uma das primeiras vilas brasileiras. O marco em pedra com a cruz-símbolo da coroa portuguesa, num dos acessos à Praia dos Anjos, hoje indica o local onde os primeiros colonizadores arriaram as velas. Desde então, tudo em Arraial do Cabo gira em torno dali.

Mas não é o interesse histórico que atrai os viajantes de hoje. O que arrasta até o porto uma multidão a cada manhã de sol são os passeios de barco, que começam por volta das 10h, quando pescadores cruzam com turistas no cais. Só navegando é possível visitar a Praia do Farol, na Ilha de Cabo Frio, a vedete do programa. Desde a chegada das naus lusitanas a paisagem nada mudou: areias incrivelmente brancas fazem as águas parecerem ainda mais límpidas do que são. O mar tranqüilo alcança todos os tons possíveis do azul. Detrás, só dunas e a mata árida de cactos e arbustos espinhosos característica da Região dos Lagos - e a torre que ilumina o caminho dos navegantes. O Caribe mora ao lado: a exatamente 170 quilômetros do Rio de Janeiro, mais 30 minutinhos de barco. Ricardo Freire que me desculpe, mas Caribe barato é isso aí.

Até porque, e este é outro grande trunfo de Arraial do Cabo, os preços de pousadas, restaurantes, passeios e bares - e até das onipresentes feirinhas de artesanato - são bem mais camaradas do que na vizinhança mais famosa: Búzios, a 35 quilômetros, e Cabo Frio, a 13. E as praias visitadas no passeio de barco (além da Praia do Farol, há paradas nas Prainhas do Pontal e na Praia do Forno, ambas acessíveis só por trilha ou pelo mar) nada ficam a dever às mais belas do balneário de la Bardot.

Os passeios custam 20 reais por pessoa - em Búzios, programa similar sai por 60 reais. Com direito a pechincha. O preço inclui água, refrigerante e caipirinha à vontade. Mas se deve ter cuidado com a trilha sonora. Das caixas de som de boa parte das embarcações sai uma mistura do melhor da música baiana com pagodes choramingantes e os funks da estação. Um sucesso de rádio AM atrás do outro. E o pior: alto pra dedéu. Informe-se antes para não correr o risco de passar quatro horas, tempo médio de duração do passeio, escutando sucessos como Se Ela Dança, Eu Danço.

Uma solução pode ser contratar alguma embarcação um pouco menor, alugada com exclusividade para um grupo de amigos. Por 450 reais (água, refrigerante e caipirinha incluídos), independente do número de pessoas, Eduardo Chilling coloca seu barco com capacidade para 30 passageiros à disposição o dia inteiro. "Fazemos o passeio sem pressa com muito mais privacidade. O grupo decide o tempo de permanência em cada lugar. É um pecado ficar só meia hora na Praia do Farol", diz. Dá tempo para fazer as trilhas que cruzam a Ilha de Cabo Frio, impossível no roteiro-padrão das operadoras. E até um churrasco a bordo pode ser programado. O próprio barqueiro ajuda a montar o cardápio. "Se pedirem com antecedência, podemos até providenciar os peixes com os pescadores."

É esse clima de vila de pescadores que predomina e faz da cidade um lugar especial pela simplicidade. Em Arraial do Cabo não há pousadas nem restaurantes sofisticados. Mas é possível comer muito bem em endereços como o Viagem dos Sabores, o Saint Tropez e o Hissao. Boa parte disso deve-se à matéria-prima de qualidade. Os pescados chegam à mesa quase vivos. "Além dos mexilhões de criação própria, também servimos peixes e outros frutos do mar. Tudo pescado na região. Por isso, sempre frescos", diz o francês Gabriel Simon Vermut, dono do Viking, restaurante flutuante na Praia do Forno, sempre a última parada dos passeios de barco. Entre uma garfada e outra, dá para ver a fazenda de mariscos que abastece a cozinha. Vai uma ostra aí?

Ao contrário de Búzios, ninguém cruza com um famoso a cada esquina. O visitante regular mais ilustre é a atriz global Flávia Alessandra, nascida ali, que se hospeda na pousada Capitão n'Areia - de propriedade da família da artista, é uma das melhores da cidade. Fica logo ao lado do marco histórico, debruçada sobre a Praia dos Anjos e com vista para o cais. A um passo da areia estão as mesas do Porto das Delícias, restaurante com cardápio brasileiro e toques orientais, o ambiente mais romântico de Arraial do Cabo. É o complemento mais que perfeito para depois de apreciar o poente no Pontal do Atalaia, um clássico, programa preferido dos fi ns de tarde dos casais que se sentam nas encostas para se despedir do sol, que se deita lentamente no mar e colore todo o horizonte.

Se para alguns Arraial do Cabo é uma opção mais barata e tranqüila que Cabo Frio e Búzios, para a turma do mergulho é um dos mais cobiçados destinos do país. Nem a água gelada amedronta. "Arraial do Cabo é um dos melhores pontos de mergulho do Brasil, junto a Abrolhos e Fernando de Noronha", diz o oceanógrafo e instrutor de mergulho Max Freitas, da Max Divers, que oferece cursos e leva grupos para mergulhar na região. "Há imensa variedade de espécies. Tartaruga, golfinho, tudo. Os animais são atraídos pela grande fartura de nutrientes trazidos pelas correntes aquáticas.

E estabelecem colônias gigantescas aqui." Ele refere-se a um fenômeno raro, conhecido como ressurgência, que ocorre também no Peru e na Namíbia. As águas geladas das correntes polares viajam pelas profundezas do oceano até Arraial, quando emergem levando à superfície o plâncton que forma a base da cadeia alimentar da região, atraindo uma fauna variada, uma das maiores biodiversidades marinhas do Atlântico.

Mas não é só a superpopulação que atrai tantos mergulhadores. A visibilidade é imensa. Além de geladas, as águas que ressurgem são absolutamente limpas e transparentes. O que favorece a observação de meros, lulas, lagostas, arraias e tantas outras espécies que vivem por lá. Prontas para serem fisgadas pelos pescadores. Ou para servir de isca para os visitantes.

Revista Viagem e Turismo

0 comentários: